Coube à ministra Rosa Weber – descrita na imprensa nos últimos dias como o “equilíbrio institucional do STF” ou mesmo como “moderadora do Supremo” – enunciar, na tarde desta quinta-feira, a surpreendente decisão do Supremo Tribunal Federal no julgamento do habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Foi dela a solução que impediu a prisão de Lula pelas próximas duas semanas, embora a corte não tenha tomado resolução definitiva sobre o caso.
Conhecida pela atuação discreta, Weber sugeriu que o julgamento fosse suspenso – visto que já eram 19h (horário de Brasília) – mas ressalvou que, dada a impossibilidade de que o Tribunal decidisse a questão, isso não deveria representar um prejuízo para o ex-petista.
Logo, sugeriu que o pedido da defesa de salvaguardar a liberdade do ex-presidente fosse aceito até que o STF volte a apreciar o assunto, no próximo dia 4 de abril.
Não está claro se foi ela quem teve a ideia de suspender o julgamento ao mesmo tempo em que concordava parcialmente com a defesa ou se Weber, por ser tida como a menos exaltada dos ministros, acabou escolhida para apresentar a ideia.
Tão logo enunciou o plano, Weber recebeu ampla acolhida dos colegas: o ministro Marco Aurélio Mello chegou a mostrar um cartão de embarque impresso para dizer que não poderia continuar na sessão, mas que concordava plenamente com a sugestão de Weber. Além de Mello e Weber, concordaram com a tese Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello.
O STF foi mergulhado em um clima de tensão nas últimas semanas, com a proximidade da conclusão do julgamento do Lula em segunda instância, o que viabilizaria sua prisão imediata. Na tarde de quarta-feira, o estresse entre os magistrados transbordou em discussão entre os ministros Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes.
Ambos trocaram insultos e acusações, que incluíram até mesmo a afirmação de que Gilmar sofreria de “pitadas de psicopatia”. No plenário Supremo Tribunal Federal, enquanto os colegas se agrediam, a ministra Rosa Weber mexia tranquilamente em seu computador.
O comportamento avesso à polêmica é representativo de seu histórico de pouco mais de seis anos como ministra da Corte.
Diferentemente de ministros que costumam fazer aparições frequentes na mídia e dar declarações públicas sobre os mais diversos assuntos, Weber demonstra suas convicções principalmente por meio de seus votos – que costumam ser objetivos e rápidos. Ela não demonstra encantamento pelo protagonismo nas transmissões da TV Justiça.
Diante de altercações frequentes entre ministros do STF nos últimos anos, Weber tem arrancado elogios no ambiente jurídico por não antecipar votos, não comentar casos nem desrespeitar os colegas.
No começo da semana, no entanto, os olhares se voltaram para ela justamente por causa do julgamento no STF do habeas corpus preventivo de Lula.
A posição de Weber sobre a questão era considerada uma incógnita porque – após a decisão da Corte que permitiu prisão depois da condenação em segunda instância, resolução contrária ao voto que Weber expressou na ocasião – ela acatou o entendimento dos colegas e passou a adotá-lo em suas próprias decisões.
Desde 2016, quando a decisão do STF foi tomada, ela tampouco voltou a se pronunciar publicamente sobre o tema.
Quem é Rosa Weber?
Weber foi a primeira juíza do trabalho e a terceira mulher a se tornar ministra na história do STF. Aos 69 anos, tem apenas mais um ano no Supremo – ministros são obrigados a se aposentar aos 70.
Filha de um médico e de uma pecuarista, Weber é casada com um procurador do Estado aposentado e tem dois filhos. É fluente em francês e torce pelo Internacional.
Nascida no Rio de Janeiro, se formou em Direito na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, onde desenvolveu boa parte da carreira. Entrou para a magistratura em 1976 e alcançou o cargo de juíza do Tribunal Regional do Trabalho em Porto Alegre em 1991.
Deu aula de direito por apenas um ano, entre 1989 e 1990, na PUC-RS. Em 2006, foi indicada para o Tribunal Superior do Trabalho pelo então presidente Lula.
O perfil mais técnico e menos político de Weber foi um dos fatores que pesaram em seu favor quando foi indicada pela presidente Dilma Rousseff, em 2011, para assumir o lugar da ex-ministra Ellen Gracie na Corte Suprema. À época, o governo petista buscava um nome que tivesse forte currículo jurídico e cuja indicação não gerasse controvérsia.
Dilma já havia expressado intenção de indicar uma mulher e analisava vários nomes. Weber foi amplamente defendida pelo então governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, e pelo ex-marido da presidente, Carlos Araújo.
O perfil discreto que hoje motiva elogios foi alvo de críticas à epoca de sua nomeação. Na sabatina que enfrentou na Comissão de Constituição de Justiça do Senado, ela se recusou a responder algumas perguntas por estar impedida de comentar assuntos em andamento na Justiça – o que levou o jornal O Estado de S. Paulo, por exemplo, a dizer que “Rosa Weber não se saiu bem na sabatina a que foi submetida”.
No entanto, ela foi aprovada por 19 votos contra 3 – em grande parte graças às respostas diplomáticas que deu às perguntas mais capciosas.
Desde então, a ministra tem mantido a mesma postura no STF. Como ela não fala fora do autos, seu posicionamento precisa ser analisado com base no padrão de sua decisões. A tendência que surge daí, no entanto, não é certeira, já que Weber costuma ponderar os argumentos dos colegas e não decide sempre numa mesma direção.
Uma pesquisa da Fundação Getulio Vargas (FGV) divulgada no ano passado apontou, com base em nove mil processos, que, na área penal, ela tem uma harmonia maior com a ministra Cármen Lúcia e com os ministros Fachin e Barroso.
Entre suas decisões importantes nos últimos tempos estão a negativa de dois pedidos para suspender a intervenção do governo federal no Rio de Janeiro, em fevereiro, e o arquivamento de um inquérito de caixa dois contra o senador José Serra (PSDB-SP), em março.
A ministra também negou o pedido de uma jovem universitária, grávida de 6 semanas, para fazer um aborto, em novembro do ano passado – ela é relatora de uma ação sobre descriminalização do aborto.
Embora já tenha dito em um julgamento da Primeira Turma que é favorável à descriminalização do aborto nos três primeiros meses de gestação, ela decidiu que a ação não era o instrumento adequado para a discussão e, por isso, não avaliou o pedido. Acabou pesadamente criticada nas redes sociais por ser mulher e ter tomado essa decisão.
Vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Weber se tornará presidente do TSE em agosto e terá um papel crucial nas eleições deste ano.