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Líderes religiosos debatem intolerância religiosa na Casa da Cidadania

Osvaldo Cruz
12 Min Leitura

dsc_0372Câmara Municipal realizou, na manhã desta quinta-feira (17), no plenário da Casa, uma audiência pública para debater intolerância religiosa no âmbito do município de Feira de Santana, atendendo ao requerimento da Comissão de Reparação, Direitos Humanos, Defesa do Consumidor e Proteção à Mulher.

Compuseram a mesa de honra o vereador Pablo Roberto, presidente da referida Comissão; o arcebispo metropolitano de Feira de Santana, Dom Zanoni Dementino Castro; Jorge Luiz Nery de Santana, da Igreja Batista Nazaré; Sizino Oliveira da Silva, do Comitê Interreligioso e das Liberdades Laicas; além de Maria das Graças Ferreira Santos, coordenadora da Federação dos Cultos Afro Brasileiros.

O vereador Pablo Roberto externou sua alegria e satisfação em participar de mais um debate acerca do tema. “É uma satisfação para a Câmara Municipal de Feira de Santana, em especial para a comissão, estar nesta manhã debatendo a intolerância religiosa em mais uma importante audiência pública; este tema é muito importante e tem sido discutido na Câmara, nesta legislatura”, afirmou.

O advogado Sizino Oliveira da Silva, do Comitê Interreligioso e das Liberdades Laicas, falou a respeito da denominação do Estado laico e da necessidade de que o Poder Legislativo feirense tenha um papel efetivo no combate à intolerância religiosa, dentro do seu âmbito de atuação.

Sinizo pontuou que pautar discursos em preceitos religiosos é a forma mais grave de intolerância. “Fica o nosso apelo e nossa reivindicação para que este Poder Legislativo possa efetivar o Estado Laico no âmbito da sua competência e, consequentemente, possa combater a intolerância religiosa, e isso não se trata de um favor”, disse.

O arcebispo metropolitano de Feira de Santana, Dom Zanoni Dementino Castro, destacou a importância de manter o diálogo e o respeito junto a todas as religiões, e que na política não se defenda preceitos religiosos ou bandeiras religiosas em discursos e projetos.

“Temos um caminho a percorrer, creio que esta sessão, embora não tão participada e valorizada quando deveria, é um sinal forte do que propomos. Devemos nos empenhar pelo Estado laico, não somos um estado católico, pentecostal, muçulmano, mas que cada um possa celebrar seu culto com dignidade. Queremos uma escola sem partido, nas igrejas, nas religiões não cabem bandeiras partidárias”, salientou.

Na condição de representante das religiões de matriz africana, Maria das Graças Ferreira Santos, coordenadora da Federação dos Cultos Afro Brasileiros, falou sobre o desrespeito e a violência que vêm sofrendo os seguidores de religiões afro.

“Hoje estou aqui para abrir o meu peito de viver em uma cidade que nasci, me criei, me tornei uma senhora. Não pensei de ver e presenciar o que tenho vivido com o meu povo de matriz africano, através da intolerância religiosa. É triste você ver sua casa apedrejada, os sons dos atabaques têm que ser calados por conta de algumas pessoas estarem com o som dos carros ligados. É triste quando você chega em um posto policial para afirmar que sua casa está sendo atingida por garrafas e ouve o policial dizer que isso deve estar acontecendo porque as pessoas não gostam do candomblé”, lamentou, indagando até quando os adeptos das religiões de matriz africana passarão por constrangimentos.

Maria das Graças lamentou que ainda hoje tenha que andar na rua sendo observada ou julgada, tratada com preconceito, “como se eu tivesse uma doença contagiosa”. Na oportunidade, ela criticou a ausência de projetos na Câmara Municipal de Feira de Santana em prol das religiões africanas.

“Quando eu, que me coloco como povo de santo, vejo nesta Casa os edis que estão aqui, que não fazem nada por nós, claro que toda regra tem exceção, mas não tem projetos para nós, os projetos são pela intolerância, para tirar direitos adquiridos”, queixou-se, ressaltando a pequena participação na audiência pública, tanto dos vereadores quanto da população.

O pastor Jorge Luiz Nery de Santana, da Igreja Batista de Nazaré, e membro do Comitê Interreligioso e das Liberdades Laicas (COINTER) falou sobre o papel da entidade que foi criada no dia 11 de novembro de 2015, após a realização da primeira audiência pública que debateu intolerância religiosa na Câmara Municipal de Feira de Santana.

De acordo com Jorge Luiz, o COINTER se constitui como uma organização civil formada por representantes de diferentes grupos religiosos e entidades laicas, comprometidos com a promoção do diálogo, do respeito e da diversidade entre indivíduos e coletividades que vivenciam suas crenças e não crenças em Feira de Santana.

Segundo o pastor, atualmente o COINTER vem realizando um trabalho junto às escolas municipais com base na lei nº 2.999/2009, criada aqui na Câmara de Vereadores, pelo então edil Frei Cal, contra a intolerância religiosa.

“Este ano, infelizmente, o Governo Municipal não pode colaborar como esperávamos, mas a Secretaria de Educação, através da secretária Jayana Ribeiro, abriu as escolas municipais, uma vez que a lei fala do trabalho nas escolas, e estamos fazendo visitas a algumas escolas municipais. A ideia é que isso se aprofunde, formando novas gerações”, pontuou, salientando a importância de se debater, sobretudo com as novas gerações, intolerância religiosa, para que as relações humanas possam ser melhoradas.

O COINTER tem como preceitos a defesa do Estado laico e das liberdades de crença, consciência e expressão em todas as esferas públicas; o respeito a todas as vivências religiosas e a todas as liberdades laicas, tanto em âmbito individual quanto coletivo, e o compromisso com a integridade dos locais de culto, liturgia, celebração religiosa, reflexão filosófica ou existencial.

Marcelo Martinho, da Federação Espírita da Bahia, ressaltou que apesar da guerra religiosa no oriente médio, que choca o mundo, o Brasil tem travado importantes debates acerca do assunto. Ele acredita que a audiência pública é um passo importante para que Feira de Santana seja um exemplo no combate à intolerância religiosa no país.

“Estamos no nosso Brasil, onde várias representações religiosas se reúnem para celebrar a paz que estamos construindo. Como brasileiro, me sinto muito orgulho em estar participando deste momento, e é importante que estejamos atentos para o significado simbólico deste momento. Estamos dando exemplo para o Brasil e para o mundo; estamos todos aqui, de denominações religiosas diferentes, reunidos em uma causa comum”, disse.

Martinho acrescentou: “o mundo passa por um momento de intolerância e estamos aqui dando exemplo de harmonia. Só estamos começando e tenho certeza de que nos próximos anos o povo feirense vai se orgulhar, porque um dia a imprensa nacional, o nosso país vai reconhecer Feira como um local que combate à intolerância religiosa e promove a cultura de paz em nosso país”, pontuou.

O representante da Igreja Anglicana, o reverendo Adriano, lembrou que a audiência faz alusão ao Dia Municipal de Combate à Intolerância Religiosa. “Recordar que este momento que estamos vivendo aqui, as visitas às escolas que estão sendo realizadas e a caminhada que haverá no domingo são em atenção à Lei de Combate à Intolerância Religiosa, que estabeleceu o dia 16 de novembro”.

O professor de História e Filosofia e bispo da Igreja Ortodoxa Celta de Feira de Santana, Dom Sérgio Muricy, ressaltou a importância da audiência e das visitas que estão sendo feitas às escolas municipais, com o objetivo de combater atitudes ofensivas a diferentes crenças e religiões. Ele avalia a iniciativa como um caminho importante a ser seguido.

“Quero parabenizar mais uma vez o vereador Pablo Roberto, que com muita boa vontade desde o ano passado, conduz a audiência, e pelo espírito ecumênico que marcou esta audiência”, disse.

Dom Sérgio Muricy continuou: “sou professor de História e Filosofia e há 30 anos vivencio nas minhas turmas, atualmente dou aula no Colégio Modelo, vivencio o que o povo de santo sofre. Ainda têm aqueles alunos que batem na mesa e dizem: ‘Deus me livre, isso é coisa do demônio’. Por isso, acho que o COINTER está no caminho certo ao fazer um trabalho de base com as escolas públicas de Feira, tanto do Estado quanto do Município. Não adianta conscientizarmos os adultos com caminhadas, se não atuarmos na base, com os estudantes. Posso dizer, com responsabilidade e experiência, como educador e religioso, que a saída é esta”, acredita.

O bispo da Igreja Ortodoxa Celta de Feira de Santana criticou o poder público municipal, que, segundo ele, não teria disponibilizado verba para a realização da Caminhada Contra a Intolerância Religiosa, que acontece no próximo domingo (20), às 8 h30, com saída do Palace Hotel.

“O COINTER há mais de 4, 5 meses vem lutando por uma verba, um carro de som, junto com o Movimento Negro, e não conseguimos um carro de som para domingo. Então, esta é a nossa cidade de Feira de Santana, que o poder público é zero, o senhor prefeito é zero no que se refere ao financiamento, e a gente precisa denunciar isso, não podemos ter medo. Vamos fazer a caminhada com o Movimento Negro, às 8h30 da manhã, do Hotel Palace, com a cara e a coragem”, declarou.

Ainda participaram do debate pessoas que estavam presentes nas galerias, que ressaltaram, entre outras coisas, a importância do respeito às religiões e do trabalho que vem sendo realizado pelo COINTER, em Feira de Santana. Elas também teceram críticas à falta de apoio do poder público municipal e às ideias fundamentalistas e preconceituosas defendidas, sobretudo por políticos e líderes religiosos.

A audiência pública foi prestigiada pelo vereador José Carneiro Rocha (PSDB); Ilê Siboadão Aliny Pinheiro Queiroz; Diácono Gilberto Santana, representante da Arquidiocese do Comitê Interreligioso de Feira de Santana; Lourdes Santana do Núcleo Odungê, profissionais da imprensa e pessoas da comunidade.

Ascom

 

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