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Como Lula perdeu primeiro round político do seu governo

Osvaldo Cruz
6 Min Leitura

Os anúncios de apoio em série à reeleição do deputado Arthur Lira (PP/AL) para a presidência da Câmara mostram que Lula não conquistou seu primeiro objetivo estratégico desde que venceu a eleição: ter suporte político suficiente no Congresso Nacional para retomar o poder de agenda para o Executivo.

Antes do resultado do primeiro turno, fontes de partidos de centro avisavam que Lula tentaria usar os cargos no governo federal para montar uma base que lhe permitisse influenciar a eleição na Câmara e obter uma liderança mais alinhada com a recuperação do protagonismo do Planalto. A vitória de partidos conservadores acendeu uma luz amarela mas, mesmo assim, sua conquista no dia 30 de outubro abriu nova janela de negociação com líderes que resistiram a se anunciarem na oposição.

Sem fazer qualquer aproximação política, no entanto, a equipe de transição, ao invés de seduzir aliados, começou seu trabalho apresentando a ideia de uma PEC pedindo muito dinheiro, iniciando uma negociação que não podia bancar. O primeiro a notar o erro foi o senador Renan Calheiros (MDB/AL), que classificou o movimento de barbeiragem.

Olhando retrospectivamente, a análise é simples. Lula pediu um cheque gordo para o Congresso e até mesmo uma parte das suas prerrogativas recém conquistadas. Gerou expectativa entre deputados e senadores por espaços na Administração Federal e…  sumiu. Sua ausência por duas semanas (uma para cumprir uma agenda internacional e outra por licença médica) sem delegar o poder de fazer composições políticas serviu apenas para desautorizar o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin e deixar claro que o PT terá um papel central nas áreas de políticas pública mais estratégicas, desconstruindo o wishfull thinking pós-eleitoral de que haveria um governo de coalizão, com pouco viés esquerdista.

Além disso, declarações agressivas contra o mercado ajudaram a reavivar memórias negativas de experiências passadas do PT no que diz respeito à forma de conduzir a economia, fazendo com que uma liderança técnica do partido ter desabafado em uma conversa pessoal que “tudo bem que Lula quisesse redimir da biografia neste governo, mas querer também redimir o governo Dilma (Rousseff) era um pouco demais!”. Setores empresariais e representantes do mercado, que fazem parte da rede de vasos comunicantes que se conecta com deputados e senadores, trataram de disparar seus alertas, como não poderia deixar de ser.

 

O fato é que o novo governo, querendo exercer factualmente o poder sem ter sentado na cadeira, entrou em um difícil labirinto. Para aprovar a PEC, terá que fazer concessões para acomodar partidos não aliados na formação do novo governo? Lula conseguirá distribuir espaços no governo atendendo apenas aos amigos primeira e segunda hora e, mesmo assim, obter os recursos orçamentários e de poder que está pleiteando? Uma coisa pelo menos é certa. Lula montará seu ministério tendo que administrar mais conflitos do que gostaria e corre sério risco de iniciar sua gestão já tendo perdido sua primeira batalha legislativa.

O fato é que enquanto Lula viajava ou se resguardava, os partidos do centro não foram procurados por ninguém ou receberam qualquer oferta de participação efetiva no próximo governo. Assim, Lira ficou com caminho aberto para consolidar sua reeleição de forma mais fácil do que se podia imaginar, tanto que um eventual apoio ou não de Lula ao seu nome ser, hoje, em termos de resultado, pouco relevante.

E o cenário pode ficar pior para o Planalto. Se Lira concretizar a ideia de um blocão com os principais partidos do centro, o PT não presidirá nenhuma comissão parlamentar das mais importantes na Câmara.

E, percebendo a dificuldade de aprovação da PEC, deputados do PT estariam defendendo nos bastidores que se recorra ao STF para obter os recursos extra-Teto para pagar o Bolsa Família. É possível pensar, dadas as circunstâncias de animosidade entre o mundo político e o Judiciário, em uma inauguração de governo mais complicada do que uma que, depois de perder a batalha política, recorre ao STF para poder contar com os recursos negados por deputados e senadores?

Os anúncios de apoio a Lira, portanto, mostram que Lula não conseguiu fortalecer sua posição no Legislativo e ainda perdeu terreno. A questão que se coloca a partir daí é como o futuro governo organizará sua base partindo de um ponto tão desfavorável (a coalizão de esquerda tem apenas 133 deputados).

Há dois cenários.

No primeiro, Lula decide governar com minoria e passa a negociar pauta a pauta, tentando atrair detratores, praticando um grande varejo no Congresso e reduzindo sua pauta legislativa ao mínimo possível. O outro é reconhecer em Lira um igual, assim como fez Jair Bolsonaro, convidando-o para assumir protagonismo na agenda do governo e a participar (ou seu grupo mais próximo) do desenho das principais decisões, dando continuidade ao semipresidencialismo de fato existente hoje no Brasil.

Fonte O Antagonista 

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